Foi em 1933 o ano que se deu o primeiro marco político aliado à luta de gênero. Carlota de Queirós foi a primeira mulher eleita no país, deputada federal. Desde então, noventa anos se passaram, e, atualmente das 513 vagas, apenas 91 são mulheres, fazendo o recorte de 17,7%. A luta pela igualdade e equidade de gênero vem sendo extremamente dificultosa quando se fala de espaços de poder, os quais foram criados e sempre utilizados pelos homens. Ordem, controle e destaque, massivamente se visualiza homens gerenciando e ocupando esses espaços de forma absolutamente natural.
Quando analisamos o sistema político, criado no intuito de gerar o controle e estabilidade social, não se pode deixar de observar qual o papel reservado para as mulheres e a limitação de sua participação. Através dessa cultura sistemática, evidenciamos a extrema dificuldade do gênero em competir com seus pares quanto aos espaços de poder, em razão das condições, à mais facilitada interpretação do conceito, coloca-se sempre em posição de desvantagem ante as responsabilidades e a sobrecarga imposta à estas. Fato este que se reflete em dados quando se observa a subrepresentatividade feminina nos espaços de poder.
A competitividade exige condições de paridade, barrada notoriamente por um sistema criado para perpetuar privilégios aos seus próprios criadores, homens. Ainda, vislumbra-se tais realidades se refletem nos mais diversos espaços quando se fala na ocupação dos maiores cargos de destaque, por exemplo, atualmente no sistema judiciário, segundo dados do Conselho Nacional de Justiça, as mulheres alcançaram o percentual de 54,7% (2018), porém, quando confrontamos com os espaços de poder que são políticos, as mulheres ocupam 21% das Presidências e menos de 25% das indicações para cargos de Desembargadoras. Pior quando se analisa os tribunais superiores, nos últimos dez anos o percentual reduziu de 23% para 19% da participação feminina. No Supremo Tribunal Federal, de onze cadeiras, duas são ocupadas por mulheres.
Tais dados trazem forte o enfrentamento quanto as condições de competência. Quando se trata de cargos com ingresso por meio de competição intelectual, porém, vemos uma forte dicotomia em relação a espaços compostos por indicações políticas.
Por óbvio, a sobrecarga de funções exacerbada direcionada às mulheres é o primeiro enfoque que se visualiza no comparativo da participação política, que exige demandas e dedicações quase que exclusivas, quando estas não podem abrir mão da vida cotidiana e familiar para focar no crescimento profissional ou até mesmo, no sonho de ter uma carreira política, enquanto os homens, tem a liberdade de, não só poder como fazer tais renúncias.
Aos próprios partidos políticos se inserem a responsabilidade quanto a sua composição quando não utiliza de estratégias reais e eficazes a fim de fomentar a participação feminina e não entrega a elas os espaços de destaque, aproveitando-se do discurso de “maior participação feminina na política” como mero oportunismo midiático publicitário.
A utilização da sexualização dentro das reuniões internas; a limitação da capacidade feminina em apenas pautas sociais; discursos com tentativas de desqualifica; agressões verbais e a pressão de um conservadorismo para fins de merecimento a ocupar espaços sem causar fortes impactos na estrutura patriarcal. “Louca”, “descontrolada”, “histérica”, são alguns adjetivos cotidianamente conhecido pelas mulheres que ousam reivindicar o seu espaço. A questão principal é que a participação feminina traz um grave risco a um sistema que sobrevive e se alimenta do caos.
A desconstrução dos privilégios advém de uma quebra brusca da cultura estrutural ao qual, incube aos próprios privilegiados abdicarem de suas benesses costumeiras para que sejam ocupadas pelo diverso – mesmo contra a sua vontade por exigência legal – entregando a quem é realmente a detentora do direito de ocupar aquele espaço, ainda que, passamos a nos limitar apenas em uma merecida compensação histórica.
Ao que se observa, mesmo após 90 anos da primeira vitória social política no Brasil, ainda em 2023 estamos tão afastadas da sonhada igualdade quanto em 1933, com a diferença que agora o inimigo – machismo – apropria-se do discurso da luta, trazendo a ideia oculta de inexistência, enquanto se perpetua e se aconchega deitado eternamente em berço esplêndido.
*As opiniões contidas nesta coluna não refletem necessariamente a opinião da JSB.